11.11.08

Pedagogia de Projetos

“ Chegou a hora – disse a Morsa – de falar sobre muitas coisas”.
Alice no país das Maravilhas – Lewis Carroll

A Pedagogia de Projetos é hoje muito veiculada no cenário pedagógico, porém, a idéia não é tão nova. Ela remonta aos ideais pedagógicos do início do século, quando se falava em ensino global e sobre o qual se debruçaram famosos educadores, entre eles, os norte-americanos John Dewey (1852-1952) e Willian Kilpatrick (1871-1965). Idealizada inicialmente por Kilpatrick (1974), discípulo de Dewey e, atualmente, re-estruturada e veiculada por Hernandez, a pedagogia de projetos teve início a partir do pressuposto da importância de se desempenhar, no espaço escolar, atividades com intenções definidas ou integradas a partir de propósitos pessoais.
“É uma experiência valiosa, unitária, intencional, intensamente auto-motivada e realizada em situação real, cujo objetivo determina os rumos das atividades e guia os seus passos até sua completa realização. Só uma atividade aceita e projetada pelos alunos pode fazer da vida escolar uma vida que eles sintam que vale a pena viver” (Kilpatrick 1974, p. 11).
O Método dos Projetos de Kilpatrick parte de problemas reais, do dia-a-dia do aluno. Todas as atividades escolares realizam-se através de projetos. Originalmente ele chamou de projeto à "tarefa de casa" - "home project" - de caráter manual que a criança executava fora da escola. O projeto como metodologia didática era uma atividade intencionada que consistia em os próprios alunos fazerem algo num ambiente natural, por exemplo: construindo uma horta, poderiam aprender: ciências, linguagem, geometria, desenho, cálculo, história natural etc.
Kilpatrick classificou os projetos em quatro grupos: a) de produção: no qual se produzia algo; b) de consumo: no qual se aprendia a utilizar algo já produzido; c) para resolver um problema e d) para aperfeiçoar uma técnica de aprendizagem. Para ele, um bom projeto didático deveria abarcar as seguintes características: a) ser uma atividade motivada por meio de uma conseqüente intenção; b) caracterizar-se como um plano de trabalho, de preferência manual; c) constituir-se de atividades que impliquem uma diversidade globalizada de ensino; d) ser uma atividade que se dê num ambiente natural. Ainda para Kilpatrick, um bom projeto deveria estar pautado nos três princípios seguintes: a) princípio da situação problemática: o projeto surge de um problema que desperta o interesse do aluno, a ponto dele desejar resolvê-lo; b) princípio da experiência real anterior: em que só a experiência garante o êxito; c) princípio da eficácia social: o projeto deve ser executado em conjunto e para elucidar questões que garantam uma boa convivência (Ibid).
Percebe-se semelhança de pontos de vista entre Kilpatrick (1974) e Hernandez (1996) quanto à categorização de um bom projeto. Para Hernandez (1996) o que “poderia ser” um projeto – numa atitude que trata de manter uma certa coerência com a noção de conhecimento, ensino e aprendizagem veiculada na Metodologia de Projetos – pode ser assim caracterizado: 1) um percurso por um tema-problema que favorece a análise, a interpretação e a crítica (como contraste de pontos de vista); 2) Onde predomina a atitude de cooperação e o professor é um aprendiz e não um perito (pois ajuda a aprender sobre os temas que há de estudar com os alunos); 3) um percurso que busca estabelecer conexões e que questiona a idéia de uma versão única da realidade; 4) cada percurso é singular e se trabalha com diferentes tipos de informação; 5) o docente ensina a escutar: do que os outros dizem também podemos aprender; 6) sobre o que queremos ensinar há diferentes formas de aprender (e não sabemos se aprenderão isso ou outras coisas); 7) uma aproximação atualizada aos problemas das disciplinas e dos saberes; 8) uma forma de aprendizagem em que se leva em conta que todos os alunos podem aprender se encontrarem lugar para isso; 9) por isso, não se duvida que a aprendizagem vinculada ao fazer, à atividade manual e à intuição, também é uma forma de aprendizagem.
Desta forma, a Metodologia de Projetos possibilita desenvolver atividades de ensino e aprendizagem que permitem a contribuição de diversas áreas do conhecimento e favorece a compreensão dos multifacetados aspectos que compõem a realidade. Nesta metodologia, professor e alunos compartilham metas objetivas de trabalho e os conteúdos são organizados em torno de questões que permitem a sua re-significação no interior do processo ensino-aprendizagem.
Alunos e professor têm a possibilidade de aplicar seus conhecimentos prévios sobre determinado tema, buscar novas informações e utilizar os conhecimentos e os recursos construídos a partir de diálogos e pesquisas, atribuindo um sentido amplo ao assunto.
Ao professor, cabe planejar uma série de atividades organizadas e direcionadas para a meta objetiva preestabelecida para que, ao realizá-las, os alunos assumam coletivamente a tarefa de decidir sobre o desenvolvimento do trabalho, bem como, conheçam e discutam a produção de todos os grupos da classe. Faz-se necessário que o professor tenha clareza dos objetivos que quer alcançar, formule claramente as etapas do processo e, portanto, planeje o trabalho a ser implementado.
Devem ser incluídas no planejamento do projeto atividades de “saídas” da escola para “exploração de campo” que possibilite o contato com a realidade “além muros escolares”. A forma de organização dos conteúdos e atividades do projeto, porém, não deve representar aumento de carga horária de alunos ou professores e, tampouco, de atividades extras: ela é a maneira sine qua non para se planejar a tarefa educativa formal.
A culminância do Projeto se dá através da circulação do conhecimento construído na forma de uma atividade de expansão para o meio coletivo, ou seja, para a comunidade escolar. Desta forma, os alunos sabem objetivamente o que e porque estão executando as atividades propostas; aprendem a formular questões investigativas e a transformar dados em informações, informações em conhecimento e, conhecimento em instrumento de ação, ainda que esta ação, aos olhos de outrem, possa parecer meramente recreativa.
Pautado nessa metodologia, o professor procura estabelecer seqüências de atividades e, portanto, de aprendizagem que proporcionem ao máximo a assimilação significativa, por parte dos alunos, dos conteúdos, das atividades e dos objetivos. Desta forma, toma decisões capitais sobre a maneira de planejar, de ensinar e de avaliar – percebendo se os aprendizados prescritos foram realmente atingidos na extensão e profundidade desejadas, no decorrer do processo e não através de situações artificiais de avaliação.
Essa metodologia pretende garantir o respeito às características de cada contexto educativo e às diferenças individuais dos alunos. O critério de individualização do ensino é o ritmo de aprendizagem: alunos mais lentos precisam de mais tempo para aprender e, os mais rápidos, de menos tempo. Torna-se abolida, portanto, a idéia de “intervenções complementares compensatórias” para as dificuldades de origem individual ou social dos alunos (como a prática das aulas de apoio). A verdadeira individualização consiste em adaptar os métodos de ensino às características diferentes dos alunos e, neste particular, a metodologia de Projetos resulta bastante interessante.

Características de um planejamento a partir da Metodologia de Projetos:

o objetivo é compartilhado por todos os envolvidos;
há um produto final em função do qual todos trabalham;
dispõe-se do tempo de maneira flexível;
os alunos podem tomar decisões a respeito de muitas questões: controle do tempo, divisão e redimensionamento de tarefas, avaliação do resultado em função do plano inicial, entre outras;
planeja-se situações em que as linguagens oral e escrita se inter-relacionem de maneira contextualizada (leitura e produção de texto);
planeja-se situações lingüisticamente significativas;
pode-se envolver ou não diferentes áreas do conhecimento;
pode-se estabelecer uma intersecção entre conteúdos de diferentes áreas do conhecimento;
favorece-se o necessário compromisso do aluno com sua própria aprendizagem;
agrega-se significado à determinadas práticas habituais que não fazem qualquer sentido quando trabalhadas descontextualizadamente, tais como: cópia, ditado, produção de texto coletivo, correção exaustiva do produto final, exigência de ortografia impecável, entre outras.
Assim, sendo respeitadas as características básicas de um planejamento pautado na Metodologia de Projetos e levando-se em consideração a tipologia de conteúdos exposta acima (sugeridos por Coll, 1997), o professor deve se pautar no objetivo de construir com seus alunos um certo “corpo de condutas” – valores, atitudes, princípios, procedimentos, conceitos e fatos – que os faça perceberem quão grandiosa é a tarefa proposta.
Posto que leva em consideração a multifacetada gama de aspectos de que se constitui o sujeito cognoscente: razão, afetividade, sociabilidade e, sobretudo, corporeidade – sem o corpo não há morada para a afetividade, para a cognição ou para a sociabilidade, pois o aluno se apresenta ao mestre através de seu corpo, a partir do qual pensa, fala, toca, gesticula – pois, planejar, é “pré-ver”, é encaminhar, é acompanhar o processo e aguardar – numa “espera impaciente” – o produto: um aluno ciente e consciente do mundo, das coisas do mundo, de como lidar com os outros, com o mundo e consigo mesmo. Assim, organiza o “caos” da existência do aluno ao impor determinados limites, ao mesmo tempo em que o leva a transpor seus limites, numa busca constante pela excelência, acalentando o sonho de poder construir um sujeito que tenha espaço no grupo e que seja capaz de construir seus próprios conhecimentos.
Deste modo, os conteúdos serão significativos, pois o que acontecer em decorrência do planejamento, foi "pré-visto", feito, escolhido, pensado, sentido, analisado e empreendido com base em necessidades reais. Sábio que é, o professor reconhece seu papel de apresentar à criança o espaço público – a res publica – sem feri-la ao apresentar a ela a despedida do espaço privado e a ampliação de horizontes provocada por esta despedida.

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